Dinael Arapiun

1 ° Entrevista

ObElin - Observatório das Eleições Indígenas

Entrevista com o candidato ao cargo de vereador na cidade de Santarém, Pará , durante as Eleições 2024,  Dinael Cardoso dos Anjos, mais conhecido como Dinael Arapiuns.

Data de realização: 30 de setembro de 2024

Dinael inicia a conversa contextualizando o lugar ao qual pertence: a Aldeia Braço-Grande, localizada na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns (RESEX), entretanto é uma figura muito presente na cidade de Santarém, em que possui uma lojinha no Centro de artesanato Cristo Rei, nesse sentido ele afirma “sou artesão e empreendedor”. Depois de sua pequena introdução, a entrevista começou de fato.

1ª pergunta :Qual seu sonho?

Os sonhos, nesse caso, são quatro metas pré-estabelecidas pelo candidato. A primeira consiste em “tirar o povo do isolamento”, que tem como principal causa os impactos ambientais, tendo em vista que a crise climática agrava as secas dos rios, impossibilitando que as pessoas de sua aldeia se desloquem por meio fluvial e, além disso, não há estradas que permitam o acesso à por via terrestre. Essa situação impacta a população nos aspectos financeiros também, uma vez que os preços dos produtos consumidos por eles sofrem alta devido a produção devassada e o combustível também não se isenta da supervalorização, sendo possível encontrar o produto por 18 reais o litro, segundo o candidato.  A segunda meta é na área da saúde. que “deixa muito a desejar”, sendo possível muitas comunidades sem agentes médicos, o que comprova que a saúde indígena não está assegurada, ainda dentro dessa perspectiva, outro tópico relacionado ao bem-estar dessas pessoas é a acumulação de lixo na aldeia, que muitas vezes não tem um lugar para ser descartado e gera uma  quantidade exorbitante de lixo, possíveis causadores de enfermidades . O terceiro objetivo de Dinael é apoiar a agricultura familiar de forma concisa, sob o prisma de que ela é também é afetada pela crise hídrica, nesse sentido ele afirma  apoiar a pequena mecanização das roças de sua aldeia , com o objetivo de ajudar na plantação, conter incêndios e auxiliar o agricultor familiar. O último sonho/meta é promover educação nas comunidades tradicionais, com instituições de ensino que, no mínimo, ofereçam um curso técnico para a população, assim a aldeia não ficaria desamparada sem os mais jovens, uma vez que a maior parte desse grupo tende a sair do território para estudar. 

2ª pergunta:  Como você se descreve?

Dinael refere a si mesmo como alguém cheio de resistência, afinal para ele viver na Amazônia é sobreviver, desde os 12 anos a luta é presente em sua vida, por isso, hoje com 54 anos, ele busca proporcionar ao seu povo um viver melhor, com educação, saúde, qualidade de vida. E reitera: “Na Amazônia existe gente”.  Para o candidato, que não fez graduação, “Meu ensino superior foi as comunidades.”, nesse sentido seu conhecimento e experiência foi construído por meio dos povos tradicionais.

3ª pergunta:  Você sempre se identificou como indígena?

“Eu sou indígena”, enfatiza argumentando que não se torna indígena, mas se é, uma vez que ser indígena é mais que um cocar ou a pintura, está no sangue e na alma. 

4ª pergunta: Qual sua relação com sua comunidade?

O candidato explicita que sua campanha foi construída, não só pela sua comunidade, como também pelos outros grupos da região da Resex Tapajós-Arapiuns. Nesse sentido, esse conjunto de pessoas decidiram incentivar a candidatura de alguém que pudesse os representar, visto que não há membros desse coletivo no Legislativo de Santarém. Assim, Dinael diz: “Não  tenho grupo, tenho 82 aldeias que precisam de representação”. Além disso, conta que a coordenação de sua candidatura é composta por 40 pessoas, na maioria jovens. 

5ª pergunta:  Quais tipos de apoio você tem?

Dinael alega ser muito grato aos seus amigos, principais apoiadores de sua candidatura, tanto com investimento quanto com ajuda, no caso de seus companheiros que são donos de barco,  em suas viagens pelo território visitando as aldeias. No caso do partido, não houve apoio, pois, por meio de uma discussão com todos os candidatos concorrendo pelo grupo, decidiram direcionar os fundos partidário para as candidaturas das mulheres. 

6ª pergunta: Como você escolheu o partido?

A candidatura de Dinael foi toda pensada por seu coletivo, as tomadas de decisão não partiram somente dele, sendo levado em conta o que seria melhor para todos.

7ª pergunta: Como você faz sua campanha?

O concorrente ao cargo de vereador da cidade de Santarém diz ser um “indígena moderno”, então ele usa o instagram, facebook, compartilhamento de clientes de sua loja de artesanato e outras redes para divulgar sua campanha. Entretanto, sua propaganda eleitoral tem como ação principal as suas visitas às aldeias e, mesmo que não tenha sido possível ir a todas elas, Dinael afirma que fez o máximo que pode, batendo de porta em porta, conversando com as pessoas, uma vez que, mesmo conhecendo a realidade de seu povo e as necessidades, desenvolver propostas a partir das opiniões dos moradores é muito importante, sendo assim “gosta de construir junto”.

8ª pergunta: Você faz campanha tentando conquistar votos de não-indígenas?

“Estou concorrendo ao cargo de vereador da cidade de Santarém”, essa frase evidencia que seu ponto de vista consiste não só em resolver os problemas urgentes de suas aldeias ou de promover a qualidade de vida dessas pessoas, mas se ele ganhar a eleição, não irá representar apenas o povo que votou nele. Sob essa perspectiva, afirma: “Durmo ao lado de um extrativista e acordo com ele se autodeclarando indígena”. 

9ª pergunta: O que você pretende fazer caso seja eleito?/Quais são suas propostas?

Suas propostas foram elaboradas pelo coletivo, tendo em vista que a ideia de sua  candidatura surgiu deles. Dessa forma, eles chegaram em alguns planos emergenciais e outros mais estratégicos: organizar um grupo de assessoramento formado por representantes de organizações, entre elas o Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns (CITA), Federação das Associações de Moradores e Comunidades  do  Assentamento Agroextrativista da Gleba Lago Grande (FEAGLE) e a Organização da Resex Tapajós Arapiuns (TAPAJOARA); submeter emendas parlamentares; ajudar as populações que estão sofrendo com a escassez de água; construir o Centro de Artesanato Tapajós, levando em conta que o Centro de Artesanato Cristo Rei está localizado em um espaço alugado; promover a diversidade cultural e expandir a oferta de produtos artesanais e oficinas de artesanato.

10ª pergunta: Comentários do candidato/a.

Dinael Arapiun esclarece que seu território tem uma história muito rica, com uma enorme diversidade de pensamentos e etnias (sendo no total, 7 etnias diferentes). Ademais, conhecer a realidade de seu povo permite que ele cobre ações efetivas e defender a ideia de que se uma pessoa se candidata, ela deve ter propostas, pois a demarcação de território e outras medidas são importantes, entretanto o povo precisa viver com qualidade e acesso aos seus direitos. Outro ponto enfatizado é sua luta pela concretização da Universidade Federal do Oeste do Pará e a presença de seu povo na faculdade, que, mesmo que tenha melhorado muito, ainda não oferece, por exemplo, a presença das línguas indígenas em seus cursos. Por fim, ele declara que não tinha a intenção de se candidatar nessas eleições, tendo em vista que concorreu na de 2012 e acabou não sendo eleito, mas ainda sim seu grupo insistiu e o fez aceitar, uma vez que mesmo tendo pessoas de várias profissões na aldeia, não há representação no poder na cidade. O candidato também aborda os três juramentos que realizou ao aceitar a candidatura: ter fé em Deus e em seus ancestrais; coragem para ingressar em um campo da sociedade permeado por corrupção e determinação para enfrentar as diferenças e outras adversidades, levando em conta em que Dinael diz com concisão: “Tenho orgulho de ser indígena, de ser da Amazônia”.